quarta-feira, 13 de setembro de 2006

Mão Única

Andando pela via rápida
da minha memória
Eu tento desviar da triste história
que me corrói
Eu tento desviar a lágrima
a curva, a contramão
eu tento controlar meu coração
Eu tento, em vão.

E o que se há de falar que, enfim,
seja verdadeiro?
O que senão as vítimas fatais
que crescem em altos percentuais?
O que senão as mães desconsoladas
secando o choro em tristes almofadas?
O que senão as drásticas notícias
que mais parecem cenas fictícias?

A liberdade é este bicho esquivo e indomado
querendo dar a alguém a honra de domar.
Ah, esta honra precoce e momentânea
febre subcutânea
de repente um jardim, um anjo alado
de repente não há tempo pra voltar
de repente,
esta palavra imutavelmente instantânea.

A velocidade é sempre tentadora,
todo o perigo é um convite que enlaça.
Há uma adrenalina, um fogo, uma graça
e um inexplicável desejo de arriscar.
A vida, a matéria, a gravidade
todas estas grandezas cheias de legitimidade
tornam-se frágeis e simples de ultrapassar
a uma velocidade fascinante e assustadora.

Lembremos que esta vida é breve e cheia de cuidados
e o tempo, este tempo de pressa e ansiedade
necessita diminuir a velocidade.
Andamos em guerra, estamos armados
disparando no asfalto nossos tiros de morte
nas curvas sem volta, na inconsciência
apostando a vida num jogo de sorte
matando o que nos resta de inocência
nossos poucos anos, nossa pouca experiência
nosso pouco de tudo, nossos sonhos tantos,
que se vão também
para além dos prantos.

Deixemos os anos por conta da natureza,
não abreviemos a dádiva da vida.
A tragédia sempre se disfarça com destreza
é uma linda princesa
esperando alguém que lhe mexa na ferida.
Sejamos cautelosos, sejamos
presentes aos que nos amam.
As ruas todas, os motores, as corridas,
as madrugadas, as disputas, as bebidas,
não podem ser mais fortes nem maiores
que os sonhos que nos chamam.

O prazer de arriscar me parece uma túnica
pronta para ser usada como traje de gala.
Mas a dor da perda, a saudade, a falta que cala
serão para sempre uma estrada de mão única.

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