quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Lágrima da taça

Demorei tanto para confiar,
entregar além do corpo
Olhei receosa, por tanto tempo,
teus atos, tuas intenções
tuas flores cheias de devoções
tua ausência
os longos dias longe dos meus olhos

Tive tanto medo, tanto tanto
Segui teus passos, me aventurei
Naveguei contigo mares de todas as cores
E te amei,
te amei

Lembro-me daquelas taças todas na mesa,
da primeira vez nos vinhedos
De tantos vinhos, e eu nem sabia
compreender a lágrima da taça
A gota que escorria, espessa,
para dizer
tantas coisas sobre a uva esmagada

Falamos de tantas coisas, você e eu
Tantos sabores
Tanto medo de perder, tantos planos de vida inteira
Até que se calou a voz, secaram as mãos
levemente, lentamente
Não em silêncio, houve o grito, eco
nada suficiente

Eu não sei o que se faz
de tão linda lembrança. Sei que brilha.
Não sei se no sol das areias brancas,
que marcaram meus sonhos realizados,
Não sei se na lua das noites aconchegantes.
Não sei.

Sei que é impossível não ser.
Impossível não sentir ainda
as mãos entrelaçadas
Não sentir saudade de um riso que não existe mais
De uma companhia leve consumida
De uma certeza que, de repente,
está extinta
e escorre, vermelha, conformada,
carregada de marcas, de histórias,
exatamente como a lágrima da taça.


domingo, 15 de janeiro de 2017

Animal

Venha agora, esqueça
o manual de boas maneiras
deixe a barba, o perfume,
não me venha com adiamentos
é urgente, não vê que tremem as mãos
deixe assim, outras coisas ficam para depois
menos nós
não quero calma, nada de coisas certas
seja torto, atravesse, fuja à regra
que tudo transpire, grudem os cabelos
e os cheiros embriaguem até amanhecer
Porque nada importa, tudo urge
tudo é ontem e pode ser tarde amanhã
Veja, seja, me beije
anônimo, instintivo, sem qualquer razão
perfeitamente imperfeito
do jeito que devíamos ser






domingo, 8 de janeiro de 2017

Azul

Como o mar, o céu
a montanha, quase transparente no horizonte,
é assim meu pensamento nesta tarde

E é leve,
e infinito,
e, a despeito das minhas fraquezas,
é puro
como a criança titubeante que observo
a construir castelos na areia.

É que me identifico:
esse mar, essa imensidão,
essa calmaria, essa revolução,
esse silêncio que toca uma canção
a bandeira vermelha, ponto de atenção,
uma solidão em companhia,
sempre amistosa contradição.

E é só paz no meu coração.


quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

À luz da labareda

Entre, apague a luz.

Escute a ordem, obedeça
então inverta
antes apague a luz
só depois entre
em mim
sinta: o que não se vê
se amplifica
se faz, do jeito que se quer
os dedos, as partes que o sol não toca
tem calor, tem suor
tem som, respiração
canção de delirar

Apague a luz, nunca a labareda
mantenha viva, queime, queime,
deixe queimar.

domingo, 1 de janeiro de 2017

Enquanto dormes

Não pretendo que sejas perfeito.
Observo teus olhos
teus pelos, a linha da tua mandíbula,
dos lábios
tua respiração
teu cheiro, que vem no vento,
e só te amo.
Simples, certo,
assinado pelo meu melhor arrepio,
dispensável de mais esclarecimentos.