quinta-feira, 10 de abril de 2014

Crônicas da Paraíba

Falo daqui da Paraíba, pois sabe? Sou pisciana e agora entendo porque é que já estou falando um pouquinho assim anasalado já: uma vez li que o pisciano tende a se transformar em quem convive.

- E agora, José?
Agora tudo certo, porque daqui alguns dias já estarei em Curitiba, tomando meu leitE quentE no conforto do lar.

Mas por aqui a gente passa uns apertos com o tal do português.
Fui à farmácia mais próxima do hotel, umas duas horas da tarde. A moça estava no balcão, mas quando tentei entrar, a porta estava fechada.

Com toda minha educação e medo de ser inconveniente, perguntei, antes de entrar, quando ela abriu a porta:
- Vocês já estão em horário de atendimento?
- Héin? - a moça não entendeu, aumentou os olhos e franziu o nariz, como fazem por aqui quando não entendem alguma coisa. Vale comentar que o "hein" daqui tem acento agudo no "e", assim como eu escrevi mesmo. Repeti:
- Vocês já estão em horário de atendimento?
- Hã?

Pausa na história para comentar uma coisa engraçada por aqui, que é que o "hã" daqui é o mesmo "rã" do Paraná. O h e o j por aqui tem aquela coisa anasalada, por exemplo: ao invés de dizer JAcaré, a gente diz HÁcaré. Deu pra entender?

Por outro lado, quando você está fazendo uma afirmação, a frase começa e termina com "já":
- Já cheguei já! (leia-se: háxeguêjá)
- Já estamos indo dormir já! (leia-se: hátamuinudumijá)
Algo assim, fácil fácil de contaminar. Ontem por exemplo saiu, falando com a minha mãe ao telefone:
- Já tamos na cama já! (pronunciada assim, normal, só acrescentando o já no final - o que já é um indício de contaminação)

Mas o que mais nos confunde por aqui é o "Pronto!"
"Pronto" pode ser usado em diversas situações, sempre positivas, geralmente no começo das frases, por exemplo substituindo:
Então - "Pronto (então), você pode seguir por essa rua mesmo."
Ok - "Pronto (ok). Vamos esperar."
Sim - "Você pode me dar a receita desse bolo?" / "Pronto (sim)!"
Concordo - "Pronto (concordo)."
Aí fudeu - "A moça atravessou a rua e o carro pegou, aí pronto!
E por aí vai. Pronto é a primeira palavra que a gente precisa aprender a interpretar nessa terra. Entendeu? Pronto!

E aí tem que ter um certo cuidado com os pedidos de comida. No café da manhã, pedi uma tapioca com queijo e goiabada.
- Qual queijo? - perguntou a tapioqueira.
- Queijo comum mesmo! - respondi.
Por sorte, ela repetiu, para confirmar:
- Pronto, então uma tapioca com goiabada e queijo coalho na chapa!
Aí deu tempo de salvar e dizer que não, era com queijo mussarela - o que é queijo comum para cada um?

Ontem à noite, fazendo um pedido pelo telefone para servir o jantar no quarto, perguntei à moça que atendeu se o tamanho da porção de filé mignon servia duas pessoas.
- Depende do tamanho da sua barriga! - ela respondeu, bem feliz.
- E essa porção de iscas de peixe... Qual peixe é?
- Peixe comum mesmo!
- Certo... Mas qual peixe é o peixe comum?
- Ah, daí a senhora me pegou! Mas é bem bom o peixe, viu?
Por via das dúvidas, pedimos os dois.

Mas voltando à história da farmácia, quando a moça não entendeu minha frase pela segunda vez, quase silabei, como se fosse uma turista brasileira falando português no exterior:
- JÁ-ES-TÃO-A-TEN-DEN-DO?
Aí veio a resposta:
- Pronto!

Meu marido depois me ensinou como proceder numa situação parecida: a solução é economizar vocábulos. Eu deveria ter dito rapidinho:
- Já tá atendendo já? (leia-se: játatendenujá?)

Hoje vamos comprar um dicionário para aprender um pouquinho mais e estarmos mais aptos para a comunicação na próxima visita. Por exemplo, a gente precisa aprender se quer a coca-cola lata ou ks(?), ou se quer comer um bife zoiúdo no almoço, ou cuidar para não pedir paçoca esperando a sobremesa e receber um prato de carne de sol refogadinha, toda linda, igualzinha à paçoca que você esperava - só que não.

Delícias e perigos dessa Paraíba que eu já amo tanto já.






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